quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

Os matadouros imundos de Pernambuco e um convite à reflexão

Do Vista-se
Por Robson Fernando de Souza | Desde outubro passado a mídia pernambucana vem se engajando em denunciar um dos aspectos literalmente mais imundos da produção estadual da carne (de qualquer tipo terrestre) que abastece restaurantes, açougues, mercados e feiras livres: a insalubridade e clandestinidade da parcelamajoritária dos matadouros pernambucanos. Isso leva aos onívoros a conclusão – embora ela não seja explicitada na imprensa, que reluta em sugerir o não consumo de carne – de que, por mais que resistam, algum dia lhes será estritamente necessária a reflexão sobre mudanças na sua dieta, orientadas para a interrupção definitiva da ingestão pelo menos de carnes.
As reportagens do Diário de Pernambuco do início de outubro e da semana entre 27/11 e 03/12 e a do NETV 1ª Edição (Globo) de 28/11 sobre os matadouros públicos do estado desbancaram um mito que deixava muitos onívoros com a falsa sensação de segurança: o de que a “grande maioria” da carne comercializada viria de abatedouros higienizados que usam abate “humanitário”. Respectivamente mostraram que 83% das casas de extermínio pernambucanas não têm as mínimas condições de funcionamento e mais da metade delas é simplesmente clandestina.
Como era de se esperar da mídia atual, nada em termos éticos, que tocasse na essência escravista e assassina dos abatedouros, foi abordado pelos dois noticiários, mas pelo menos tivemos uma ideia muito clara de três aspectos: a execução explicitamente cruel dos animais – no caso dos bovinos, às marretadas –, o alto perigo que a carne oriunda desses lugares representa à saúde humana e o impacto ambiental cru desses estabelecimentos.
Conforme o Diario e o NETV mostraram, a carne é processada em total ausência de higiene. O sangue de inocentes jorra no chão, a bílis dos animais mortos é usada como se fosse um detergente, a carne é carregada rastejando no chão, os resíduos viscerais e líquidos são jogados no meio ambiente sem qualquer tratamento, rios são contaminados com sangue, carnes são vendidas sem refrigeração…
De “soluções”*, pouco se promete fora a abertura de matadouros regionais padronizados e higienizados dentro de um longo prazo para centralizar a matança dos animais, e o fechamento gradual dos antigos. Tal “solução” pode demorar anos ainda para se concretizar por completo, e enquanto isso continuará havendo todos os problemas acima referidos. Isso deixa os consumidores de carne numa sinuca de bico em relação a comer carne: ou passam a comprar carnes muito mais caras em supermercados ou terão realmente que deixar de comer isso.
Assim, criou-se um dilema onívoro a partir da derrubada do mito de que a maioria das carnes consumidas viria de lugares “adequados”. E, mais do que nunca, abre-se o caminho para o convite à reflexão sobre o consumo de animais, cujo precedente de produção foi publicamente revelado muito mais sujo, cruel e perigoso do que a ingenuidade do senso comum acreditava.
Aliás, pode-se dizer que um atalho foi aberto para a consideração do vegetarianismo como dieta saudável e livre de todos os inconvenientes produtivos denunciados pelo Diario e pela Globo. Está mais óbvio do que nunca que um consumo de carne barata não é conveniente nem mesmo para a saúde humana – as carnes realmente em condições higiênicas de consumo são bem mais caras. Menos ainda é para os animais que são vitimados por aquelas insalubres máquinas de matar e para o meio ambiente, que recebe poluentes de alta periculosidade.
Fica a seguinte reflexão, ainda que ela não tenha sido devidamente fomentada pela mídia: o que você leitor acha de considerar uma alimentação sem carnes? Ou prefere gastar muito mais – em torno de 18 reais por quilo, no caso da carne bovina –, para manter uma alimentação que tem inconvenientes éticos e ambientais tão pesados, tem grande probabilidade de causar problemas de saúde com o nível de consumo atual e pode ser perfeitamente substituída pela alimentação vegetariana com boas consequências orgânicas?

*Do ponto de vista ético, os matadouros não têm um problema demandante de soluções. Eles são (parte d)o próprio problema, cuja única solução é o seu fechamento definitivo sem substituição por novos estabelecimentos.

Referências:

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